É sim ou não: a empresa que você trabalha está na sua bio? Quando acessam seu perfil, faz parte da sua descrição? Não tô falando do LinkedIn, por óbvio. Falo das outras. As redes realmente sociais. Seus seguidores do Instagram sabem onde você queima 8 horas diárias da sua vida? O pessoal do Twitter conhece o seu segredo? Lá no Facebook, tem “cargo tal na empresa tal”? Por mais desconfortável que a pergunta seja, não podemos mais ignorar que o mundo está dividido entre os que colocam a empresa na bio e os que não colocam. Em que time você está?
Não estou aqui para dizer o que é certo ou errado. Isso vou deixar para o pessoal do coaching. Minha única intenção é provocar uma reflexão. Quem publiciza o nome da empresa tem alguma vantagem sobre quem não publiciza? Os recrutadores estão prestando atenção nisso? Seu gestor entende a empresa na bio como “vestir a camisa”? Na hora do layoff, isso vai fazer diferença? Pois é, esse texto foi feito exclusivamente para adicionar mais uma paranoia ao mundo corporativo. Alguém precisava mexer nesse vespeiro, né?
Ao longo da minha carreira, e lá se vão 1.753 anos, eu optei racionalmente por divulgar ou esconder onde trabalho. Nunca foi uma decisão impulsiva; sempre foi algo que fiz após julgar quais benefícios o nome da empresa traria para minha imagem pública. A gente não fala muito sobre isso, mas colaboradores estão o tempo todo julgando as empresas onde trabalham. E o pessoal do RH precisa saber disso: não é em slides, slogans ou treinamentos que a cultura de uma empresa nasce; é no escrutínio dos colaboradores.
Já julguei, por exemplo, a conduta dos diretores. Eram pessoas legais, benquistas por pares e colaboradores? Ou eram daquele tipo que berra para ter o que quer e depois bate na mesa pra dizer que não quer? Nem preciso dizer que o segundo tinha o nome da empresa sumariamente suprimido dos meus perfis. Não por vingança, nem por rancor, mas por pura autodefesa. Eu não quero meu nome associado a uma empresa que dá poder a quem não sabe lidar com o poder. Isso não iria pegar bem pra minha imagem.
Outro quesito que já levei em consideração foi a qualidade da empresa. E aqui é preciso deixar bem explicadinho que uma empresa boa para os clientes não é, necessariamente, boa para seus colaboradores. Já trabalhei em lugares que cumpriam rigorosamente o prazo, entregavam grandes ideias e mantinham sempre os clientes satisfeitos — enquanto o burnout levava um colega por semana para a Terra do Nunca Mais. Esse tipo de empresa não merece estar na minha bio. Seria colocar uma bandeirinha pró-assédio no meu profile.
Outro ponto importante que sempre julgo para saber se a empresa merece estar na minha bio é o cafezinho. Sim, amigo do RH, o cafezinho. Uma vez trabalhei numa empresa que regulava a quantidade de café que cada um tomava como forma de conter custos. Numa das intermináveis reuniões gerais, a diretora financeira se queixou que clientes exigiam capuccino nas reuniões e isso estava criando um rombo nas contas. O diretor mandou cortar o café e servir chá. E acrescentou: chá gelado, que nem precisa gastar com gás nem nada. Não preciso dizer que esse tipo de mesquinharia fez com que essa empresa não figurasse sequer no meu currículo. Eu não quero ser associado a quem nega cafeína ao próximo. Ninguém merece.
Mais do que se perguntar se o colaborador que não coloca a empresa na bio está realmente comprometido com o trabalho, os gestores precisam de um pouco de autocrítica. Precisam se questionar: por que minha empresa não aparece na bio dos meus colaboradores? E mais: precisam compreender essa omissão como algo premeditado, deliberado e bem-intencionado. É um recado que o colaborador está enviando para você, gestor. É um código sinalizando que a reputação da sua empresa está por um fio. Afinal, o motoboy de hoje é o diretor de marketing do seu maior cliente amanhã. Talvez seja hora de pensar numa maneira de colocar os seus colaboradores na bio da empresa, né?
E eis aqui o ponto central desse texto. Quando alguém decide omitir ou publicizar o nome da empresa onde trabalha, por mais incômodo que seja dizer isso, está na verdade enviando um recado para a empresa. E esse recado costuma ser ignorado porque gestores estão habituados a agir como se colaboradores precisassem da empresa, mas a empresa não precisasse dos colaboradores. Estamos em 2024 e temos provas suficientes para afirmar: sem nós, colaboradores, as empresas não são nada. Faz nem cinco anos que, graças ao nosso comprometimento, graças à capacidade única de adaptação que a massa trabalhadora tem, as empresas continuaram funcionando mesmo com uma pandemia assolando o mundo.
No mercado publicitário, que é onde ganho meu pão, isso foi um divisor de águas. Empresas que “tinham seus colaboradores na bio” se adaptaram rapidamente, seguiram com o trabalho remoto e muitas até cresceram durante a maior crise econômica global do século XXI. Já aquelas empresas que sonegam cafezinho tiveram que se virar, e muitas só continuaram de portas abertas porque burlaram os alertas de isolamento social e funcionaram clandestinamente em modo presencial. Porque empresas que sonegam cafezinho só conseguem produzir se mantiverem seus colaboradores sob cabresto. E nós, colaboradores, sabemos disso.
A gente precisa de mais empresas com potencial para estar em nossas bios, e mesmo empresas se perguntando por que não estão lá. Essa paranoia do bem precisa se espalhar por aí.